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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Cartas Noturnas I

Cartas Noturnas I
Fevereiro

Jony Reys


Encalorada noite de fevereiro. A chuva passageira faz brotar da terra todo seu calor, o perfume típico invade o olfato e domina todo corpo. A bela cidade dorme. Ao som de grilos barulhentos e cadelas em cio, a noite passa devagar. Os pombos roncam na cuminheira, ocupada como morada, sem permissão. Na TV os filmes se repetem e as notícias, repassadas. A face sombria do ar, retratada nos vôos rasantes de morcegos infelizes, percebe ao longe os passos calculados de felinos insones em telhados inertes. A espera é longa. O banco de memórias rejeita a senha do amanhã. Os sonhos sem sono insistem em não agradar. No infinito, estrelas tímidas teimam em surgir ante o nublado mormaço. No horizonte, luzes da metrópole,  separadas pela baía, ilumina a distância entre o paraíso e o purgatório, a paz e a sobrevivência, a paciência e a insensatez. O desconforto apela a brisa artificial, burlando o silêncio exterior. O pensamento vaga a desencontros, em tempos alternados.  A Lua, embora recatada, não se deixa vencer por nuvens cinzas que teimam em lhe ofuscar. O vazio da madrugada revolve a infame ansiedade e o pecado capital. A jovem quinta-feira nasce lenta, preguiçosa, e o desejo de escrever perece póstumo, no piscar contínuo de olhos cansados, ávidos por Orfeu.